segunda-feira, 16 de julho de 2007

AMIGOS ARQUINIMIGOS


Estava o monge num instante de profundo silêncio em meio a uma turbulenta tempestade de areia.

Tempestade chefiada por sete malfeitores, sete colunas de seres multiplicados.

Essa legião roubava as donzelas do reino e as encerravam em garrafas de vinho, vazias... Esvaziadas em orgias e bacanais. Entornavam o precioso líquido em taças de cristais, roubadas dos palácios.

De repente, lembrou-se o monge do seu poderoso Mantra que acalmava qualquer tempestade. Ao pronunciá-lo, as legiões viravam estátuas no mesmo instante. Os líderes revoltados desceram dos seus cavalos, tampando seus ouvidos com as palmas das mãos, dando assim, uma pausa nas investidas.

Era uma guerra... Atacavam e eram atacados, venciam e eram vencidos, capturavam donzelas que depois eram libertadas, enfim... Uma história sem fim.

Ficava ali sentado o santo Monge, assistindo a si mesmo desdobrando-se em imagens tumultuadas... Mal sabia que a Loucura, sua mais poderosa adversária, o espreitava por entre os arbustos daquela imensa floresta do reino. Dirigia toda sua força para provocar e distrair o “santo”.

Mas a cada passo que dava para aproximar-se do Monge, o som ficava mais distante. Intrigada com tal fenômeno, saltou, com seu sorriso sarcástico, na frente dele. O susto o emudeceu e ficou a contemplar a medonha figura descabelada.

Ela, cheia de fúria, por mais esse fracasso, sentou-se ao lado do monge e ali permaneceu em silêncio, conformada.

Ainda não foi dessa vez, pensou...

Quanta criação de imagens, quantas efígies inúteis... E mais uma vez ficou sem a Sacolinha Púrpura e o Mantra que tanto quer apoderar-se.

Quanta luta inútil, quanta batalha por um instante de serenidade e ali estava ele, com todos esses instantes, de graça. Ele sorria como uma estampa sem cor, um quase cinza tranquilo.

Por que seria o destino tão cheio de graça para alguns e para outros, uma desgraça?

Só bastavam alguns grãos daquela areia fina, para lhe dar o sono necessário. Poderia eliminar essa insônia desejada, os olhos doloridos por buscar a claridade, olheiras intensas e imagens distorcidas. Era preciso aliviar tanta vigília inútil e dormir a eternidade. Permanecer sem sonhos nem pesadelos, apenas um nada flutuando no éter, eternamente.

Queria apenas a inexistência e sua única chance estava encerrada naquela sacolinha púrpura e nos lábios daquele “inocente”. Ele nem sequer usava aqueles objetos tão preciosos e tão cobiçados, no entanto, era o dono absoluto da sacola.

Dádivas e dívidas... E dúvidas!

Inúteis questões que levavam a Loucura a loucura!

O tédio era tanto que nem se permitia usar a violência para tomar.

O Monge, cansado daquele mórbido silêncio resolveu manifestar-se com uma historinha vaga (será que ele conhecia o ponto fraco da Loucura?).

E dos seus lábios, foi destilando um doce veneno e a Loucura foi sorvendo e se embriagando, esquecendo a própria sina.

Num lapso de segundos imperceptíveis, o Monge, num gesto de loucura, levanta-se e inicia seu caminho para lugar nenhum.

A Loucura, hipnotizada pelo conto, esqueceu o que buscava. Atordoada pela doçura da voz nem percebeu o desaparecimento do monge, diante dos seus olhos.

Ao perceber o embuste, furiosa, jurou vingança eterna, ainda que isso lhe custasse o resquício de lucidez.

Bem, a Loucura foi tomar um lanche à base de nozes, para se distrair... Depois então, planejaria uma nova forma de roubar a sacolinha.

Afinal, seria loucura ficar sem comer o dia inteiro perseguindo Monges com sacolinhas.

Elizabeth

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